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A opção pela depressão (Afonso, Biasoto Jr., Viana)

A opção pela depressão por José Roberto R. Afonso, Geraldo Biasoto Jr. e Murilo Ferreira Viana publicado pela Revista Conjuntura Econômica (6/2020).

“A economia mundial, de forma inédita, mergulhou rápida e intensamente em recessão com a pandemia da Covid-19 e a imperiosidade das medidas de distanciamento social.

O governo brasileiro optou pela depressão ao apostar no negacionismo em geral, na inépcia na política econômica e numa insuficiente resposta sanitária.1 Mundo afora, expectativas de investidores e empresários foram rompidas dramaticamente, levando-os a paralisar investimentos e a reduzir a produção, e famílias diminuíram e mudaram o seu consumo, como nunca, pela impossibilidade de comprar e pela perda de renda. No Brasil, essa crise de confiança foi ainda potencializada pela estúpida crença que interesses da saúde seriam contraditórios aos econômicos e resultou que o medo de se contaminar seja mais que o dobro do que o da crise econômica.2 A depressão se tornou um destino inevitável.

Enquanto se especula entre “V” ou em “U” para a evolução da economia, termômetros evidenciam uma atividade em “L” há semanas. Entre outros indicadores, desde a segunda semana de março, transporte rodoviário de carga amargou uma queda de -41,2% na demanda geral até 17 de maio. Desde o início de março, o faturamento total da maior rede de “maquininhas” sofreu redução de 29,5% até 16 de maio – conforme gráfico a seguir.

Sopa de letras à parte, urge elaborar um diagnóstico mais acurado da depressão da Covid-19 para daí traçar um plano para seu enfrentamento e superação. A fim de instigar o debate, partimos de algumas lições teóricas ou históricas.

A reflexão sobre a crise capitalista, realizada brilhantemente por Keynes,3 mostrou que o sistema econômico funciona ancorado num conjunto de unidades econômicas que decidem sobre o volume a produzir e o emprego, a cada período de produção. No agregado, o gasto dos trabalhadores legitima as decisões empresariais inicialmente tomadas, uma vez que realiza a produção aos preços esperados.

Segundo Keynes, a quebra desta engrenagem, que, num estado normal, seria repetida por vários períodos de produção, pode gerar o colapso das expectativas empresariais. A decisão empresarial em ambiente de previsão de queda de renda dos consumidores, com frustração de vendas e preços, produz a revisão de decisões de investimento, produção e emprego. Desse modo, uma espiral descendente passa a ser operada por dentro da própria lógica operacional do sistema econômico.

A crise do sistema econômico não é racional e se caracteriza pela queda recorrente da renda e pela incerteza em relação ao futuro. O conceito de preferência pela liquidez de Keynes intencionava retratar o temor, frente à incerteza, de imobilizar dinheiro na produção, em benefício de ficar com a moeda em mãos.4

Embora estivesse longe de ser um defensor da presença permanente do Estado na economia, Keynes nunca se furtou a expressar o que sua forma de pensar a dinâmica econômica exigia para momentos de crise das expectativas. A ação compensatória de um agente autônomo, que contrapusesse a lógica dos agentes privados em retração, seria essencial para reverter o pessimismo sobre a evolução dos negócios e o temor em prescindir da posse da moeda.

As crises econômicas do pósguerra conservaram os contornos da análise realizada por Keynes, mas ganharam muito em complexidade, à medida que os sistemas de crédito e as finanças das empresas ganharam escala global e sofisticaram seu instrumental….”

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