Sistemas Tributários Regressivos em Democracias Desiguais: o caso brasileiro por Eduardo Alves Lazzari publicado por USP (2021).
Embora democracias competitivas e desiguais localizadas na América Latina tenham recentemente introduzido uma série de políticas redistributivas, mitigando a desigualdade, esses regimes o fizeram apenas por meio dos gastos, o que não era previsto pela literatura. Tendo preservado a regressividade de seus sistemas tributários, cria-se uma contradição que exige responder por que essas democracias não instrumentalizaram a tributação para fins redistributivos. Esta contradição se torna teoricamente relevante ao demonstrar que as teorias mais influentes na relação entre democracia e desigualdade – teoria do eleitor mediano, do governo partidário e de competição por outsiders – não dão conta de explicar os sentidos redistributivos divergentes entre tributação e gastos na América Latina, região que concentra democracias competitivas e desiguais. Assim, propõe-se um modelo teórico que destaca os problemas, os atributos e a disputa política específicos à tributação. Esses três fatores relegam o papel redistributivo da política tributária a um segundo plano, tornam os incentivos eleitorais inócuos para mudanças progressivas – diferentemente do que ocorre nos gastos – e ensejam disputas políticas intensas, as quais serão pautadas pela atuação de coalizões. Neste contexto, mudanças tributárias progressivas, abrangentes ou incrementais, ocorrem apenas em contextos políticos específicos. A demonstração empírica deste esquema analítico será feita por meio do estudo de caso brasileiro. Analisam-se: i) uma conjuntura crítica que forjou o atual e regressivo sistema tributário brasileiro, a ANC; ii) o conjunto de propostas legislativas na política tributária apresentadas entre 1988 e 2020; iii) a CPMF como ferramenta de elevada capacidade arrecadatória e; iv) uma tímida e fracassada tentativa de reforma tributária progressiva, a PEC 41/2003. Em todos os casos, ficará evidente como o problema precípuo na tributação é a arrecadação – não o redistributivo -, os incentivos eleitorais para mudanças progressivas não estão presentes, como a atuação de coalizões anti-progressividade – composta por partidos de centro e direita – vetam sistematicamente mudanças tributárias progressivas, no caso brasileiro, o qual é marcado pela fragilidade de coalizões pró-progressividade. Dessa forma, é a disputa política distante da dinâmica eleitoral, em função dos atributos da política tributária, e condições políticas adversas para forças pró-progressividade que contribuem para a regressividade dos sistemas tributários dessas democracias.