Regulação no Brasil: De onde e por onde já caminhamos por Rafael Silveira e Silva, Victor Marcel Pinheiro, Liziane Angelotti Meira e Hadassah Laís De Souza Santana publicado por Senado Federal (7/2020)
Este estudo pretende discorrer sobre a situação do fenômeno da agencificação no Brasil. A partir de algumas lições sobre os pressupostos que justificam a criação das agências reguladoras no País, examina-se a trajetória desses órgãos sob a ótica do desenvolvimento e da evolução de suas regras em três fases distintas: (i) a criação do modelo de agencificação; (ii) a fase dos questionamentos e da inércia do modelo e (iii) a fase da renovação do arcabouço legal. O estudo aponta a relevância do Poder Executivo na fase de implementação do modelo regulatório de agências, mas que, relativamente ao aprimoramento dos marcos legais, coube ao Congresso Nacional, especialmente ao Senado Federal, a liderança e o protagonismo.
INTRODUÇÃO
O Direito, seus institutos e a própria concepção de Estado não são estanques, nem descolados da história, da realidade social, política e econômica, da cultura e das influências ou pressões internacionais.
Necessária, por seu turno, cautela, no sentido de entender que o Estado e o Direito devem seguir no fluxo inafastável da modernidade, da globalização e da busca por mais eficiência, mas com um viés crítico, evitando o mimetismo e analisando as inovações, as mudanças do perfil do Estado e das políticas públicas com a lupa do interesse público, nacional, e considerando o jogo de forças que compõe a sociedade pluralista.
Uma das maiores evoluções que notamos na história recente do Direito Brasileiro, notadamente o Administrativo, foi observada no fenômeno da Regulação e da Agencificação. A regulação se fundamenta na ideia de uma “razão” que visa garantir a permanência, a estabilidade e a manutenção de uma determinada ordem social e política. Os autores também fazem remissão a uma dimensão “esquecida” da regulação, a política, sendo que a regulação busca o equilíbrio de diferentes atores, com poderes desiguais e ideologias diferentes.
Este artigo pretende percorrer três importantes momentos da regulação e da agencificação no Brasil, registrados em diferentes governos e épocas. Cada uma dessas fases que, inicialmente podem ser confundidas com mandados dos Presidentes da República, na verdade, representam períodos de consolidação e de amadurecimento do direito regulatório, mudando, inclusive, a chave de registro do protagonismo e da liderança em cada momento, iniciando-se com o Executivo até transitar para a liderança do Congresso Nacional na mais recente atualização do modelo de agencificação.
Iniciaremos com alguns aspectos teóricos e históricos das mudanças do papel do Estado, passando de uma intervenção forte na economia e na prestação de serviços, para uma proposta de regulação e de indução. Trataremos de dois exemplos internacionais que tratam do direito administrativo relativamente ao aparato regulatório. Em seguida iniciaremos as abordagens sobre cada fase que selecionamos.
A primeira fase trata do período de reformas do governo Fernando Henrique Cardoso, com a introdução e o início do funcionamento do modelo de agencificação no Brasil, procurando explicar os pressupostos e princípios para o funcionamento ideal desse modelo.
Com a mudança de governo, temos o início de uma fase de questionamentos e controvérsias sobre o funcionamento e o relacionamento das agências reguladoras com a administração direta. Foi um momento muito interessante do ponto de vista das ideias que fomentariam o aprimoramento do sistema, no entanto, politicamente, observou-se que foi uma fase marcada pelo declínio das agências.
As críticas que se somaram ao longo do segundo período deram força para que o Congresso Nacional, especialmente o Senado Federal, dessem importantes passos para aprimorar o sistema e tirá-lo da inércia do período anterior. Com a mudança de governo, deu-se início a uma terceira fase do modelo de agencificação, aproveitando-se de uma importante janela de oportunidade para, a partir de um conjunto de ideias e propostas que já vinham amadurecendo no Legislativo, renovar o arcabouço regulatório.