Novas tecnologias e a tributação do futuro por Rejiane Prado e Raphael Romano publicado por Consultor Jurídico (11/2020).
“O surgimento das novas tecnologias (nanotecnologia, inteligência artificial, big data, internet das coisas, criptomoedas etc.) conduziu a um avanço rápido e exponencial da economia digital, rompendo conceitos tradicionais, tornando relações sociais e jurídicas mais complexas, bem como a celebração de instrumentos contratuais e acordos empresariais multilaterais.
A “nova sociedade”, considerada como sociedade da informação, transformou o mundo físico em que vivíamos e conhecíamos. O cenário mudou radicalmente e, desde a revolução impulsionada pela internet, o mundo se virtualizou, influenciou novos processos de produção de bens e serviços aos consumidores, melhorou produtividade, relações de emprego, conduzindo a economia a ser dominada por empresas de tecnologias.
Assim, a economia digital é completamente distinta do mercado que dominava no passado e tem gerado grande repercussão na esfera social, política e econômica. Tornou modelos de tributação tradicionais questionáveis e obsoletos e impôs novos desafios e ameaças aos Estados, derivados principalmente pela ausência de presença física no país, transações complexas e dependência de ativos intangíveis, revelando inclusive interesses estratégicos.
Pela ótica da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), há quatro premissas básicas para se compreender a economia digital e por que ela impacta na tributação e arrecadação dos países: 1) a acentuada dependência de intangíveis; 2) o uso maciço de dados, especialmente os de caráter pessoal dos usuários e consumidores; 3) a frequente adoção de modelos de negócios multilaterais; e 4) a dificuldade de determinar a jurisdição na qual a criação de valor ocorre, notadamente em razão da marcante mobilidade dos ativos e “estabelecimentos” (OECD, 2015, p. 16) [1].
Toda essa transformação é apenas a ponta do iceberg, e, na verdade, o início de uma transformação que será ainda mais profunda, caracterizada pela disrupção dos limites entre os mundos físico, digital e biológico nas palavras de Klaus Schwab [2].
A Constituição Federal do Brasil foi promulgada em 1988, há mais de 30 anos, em um ambiente totalmente carente de contexto digital, em que o foco das operações era físico, e, desde então, teve poucas alterações de cunho tecnológico.
É evidente que as regras atuais de tributações internas e internacionais, como já exposto, têm se mostrado cada vez mais ineficazes e insuficientes em lidar com a revolução empreendida pelas atividades econômicas geradas no âmbito da era digital, provocando grande evasão tributária e perda de receita dos impostos.
Segundo José Roberto Rodrigues Afonso [3], no estudo “A Tributação na Era Digital e os Desafios do Sistema Tributário no Brasil” [4], elaborado pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), estima-se que negócios por trás de aplicativos e plataformas digitais, em geral, pagam muito menos impostos que os tradicionais, observada a taxa média de 8,5% em atividades domésticas a 10,15% em internacionais, no primeiro caso, comparadas com os 20,9% a 23,2%, respectivamente, nos modelos antigos de negócios.
Assim, a presença cada vez mais pujante das tecnologias digitais na caracterização de valor dos negócios empresariais tem instigado os estudiosos da tributação e criado grande dificuldade de consenso entre os países em definir o local de geração de valor e alocação de receitas tributárias…”