Uma Estimativa do Estoque de Capital de Infraestrutura no Brasil por Cláudio R. Frischtak e João Mourão trabalho preparado para o IPEA (8-2017)
“Não sem motivo, a quantidade e a qualidade da infraestrutura do país é um tema que tem sido objeto de discussão em anos recentes, tanto pela sua importância para o crescimento econômico quanto para o bem-estar da população. Em particular, se tornou um truísmo que o “custo Brasil” é também função de uma infraestrutura insuficiente, sendo um dos principais gargalos para a competitividade do país.
Ainda que se considere que a defasagem em infraestrutura se evidencia por si, há poucas estimativas da magnitude da brecha entre o que o país dispõe e o que seria desejável (ainda que não uma infraestrutura de “fronteira”). De fato, medidas físicas como km de estradas pavimentadas ou quilowatts de energia gerada são amplamente utilizadas, mas são indicadores parciais e nem sempre comparáveis a outros países. Neste sentido, é importante ter uma forma sintética de mensurar os investimentos acumulados em infraestrutura, o que refletiria – ainda que imperfeitamente – a capacidade de responder à demanda de serviços. Esta síntese seria o valor do estoque de infraestrutura ponderado pelo PIB, uma medida objetiva e facilmente comparável ao longo do tempo e a outros países.
O estoque é, por definição, uma agregação de diversos fluxos: a cada período um fluxo de “entrada” o expande, enquanto outro de “saída” o reduz. Ao longo dos anos, esse processo se repete de forma que ele é o resultado líquido acumulado dos fluxos. No caso de infraestrutura, a entrada são os investimentos feitos (rodovias, hidrelétricas, portos etc.) e a saída, a depreciação dos ativos existentes. É interessante notar que, no caso, o montante depreciado é sempre uma fração do volume estocado; logo, conforme o estoque aumenta, são necessários maiores investimentos para compensar a perda de valor dos ativos decorrente do passar dos anos.
A maior dificuldade para estimar o estoque do setor é de natureza empírica. A disponibilidade de dados de investimento é limitada, e não há na literatura que se travou conhecimento qualquer estimativa para a depreciação capital fixo investido no setor no Brasil. Entretanto, as dificuldades na obtenção das informações não são exclusividade nacional. No mundo, dados sobre investimento em infraestrutura e a depreciação dos ativos são escassos e desarmonizados. Na sessão II, este texto revisa diversos estudos destacando alguns dos principais trabalhos que tentaram estimar estoques de capital em infraestrutura para diferentes países.
Para calcular o estoque de capital no setor de infraestrutura são três os inputs necessários: uma estimativa para o estoque inicial; uma série que retrata os investimentos realizados no setor no período de referência (no caso, 1970-2016); e a taxa de depreciação dos ativos constituídos ao longo dos anos. A sessão III identifica as fontes de dados utilizadas ou – na sua ausência – como estes foram estimados.
De forma sintética, a série de investimentos cobrindo os anos 1970-2000 foi retirada de um estudo realizado pelo IPEA (Bielschowsky, 2002). Já para os anos mais recentes, utiliza-se de um levantamento próprio realizado anualmente pela Inter.B Consultoria Internacional de Negócios (Inter.B), e revisado trimestralmente há mais de uma década, cujo ponto de partida foi o ano de 2001, e cujos dados mais recentes se referem a 20161 . No que diz respeito à taxa de depreciação, esta foi resultado de extenso levantamento das taxas utilizadas pelas empresas do setor e agências reguladoras (Anexo 2). Finalmente, o estoque de infraestrutura inicial para estimativas com base em séries longas tem uma influência residual, conforme demonstrado na seção III2 .
A seção IV discute de forma breve o método do inventário perpétuo, abordagem dominante na literatura de cálculo de estoques de capital, e que consiste, basicamente, em somar os valores investidos, descontando uma taxa de depreciação3 . A vantagem dessa metodologia é ter como resultado um valor monetário, o que permite o uso de outras informações alicerçadas no sistema de preços (a exemplo do PIB) para fins de análise e comparação quanto à distância do país à fronteira dos serviços de infraestrutura.
A seção V apresenta os principais resultados, na qual se destaca o baixo valor do estoque de capital de infraestrutura na estimativa central – 36,1% do PIB em 2016. Esta magnitude espelha a redução dos investimentos no setor desde meados da década de 1980. Mais além da estimativa central, o trabalho discute a sensibilidade das estimativas a variações na taxa de depreciação.
A seção VI apresenta cenários alternativos de níveis de estoque de capital em infraestrutura como função do volume de investimentos para os próximos anos. Caso o país continue investindo em torno de 2% do PIB – média das duas últimas décadas – a modernização da infraestrutura seria adiada sine die. Um esforço para atingir uma taxa de investimentos média de 4% do PIB a partir de 2020 – factível na medida em que o setor privado assume maior protagonismo no setor – possibilitaria alcançar um estoque de 60% do PIB nos 25 anos a partir de 2020 se a economia crescesse uma média de 2% a.a. Finalmente, mesmo levando em consideração o sobre preço em obras públicas de infraestrutura, que se acentuou em anos recentes e que reduziu o estoque de infraestrutura, como mostra a seção VII, uma mudança nessas práticas possibilita a modernização com um atraso de mais um ou dois anos. Esse imperativo, em última instância, irá depender de uma reforma do Estado, incluindo a privatização de ativos de infraestrutura, maior segurança jurídica e previsibilidade regulatória, e de modo mais geral, melhoria do ambiente de negócios no país. Este o desafio do setor.”
Verificar PDF Anexado