Críticas à (única) nota sobre impactos da PEC 45 por José Roberto Afonso, Vagner Ardeo e Geraldo Biasoto publicado por Blog do IBRE (9/2020).
“Em nenhum outro país, neste momento, está-se discutindo reforma tributária de forma tão intensa como no Brasil, isso em meio à inédita pandemia internacional de saúde no pós-guerra. Nenhum especialista sugeriria e nenhum governo imaginaria aumentar a tributação sobre as vendas no mercado doméstico, sobretudo sobre os serviços, o epicentro mundial da recessão, com inevitável aumento de sua carga tributária global. Respeitam sempre a lição clássica de que aumento de tributo reduz a renda disponível e, sobretudo, o consumo interno, o que poderia disparar uma segunda onda recessiva.
A primeira onda recessiva no Brasil é a mais intensa de sua história, principalmente em função de estarmos tendo uma das piores performances em termos de controle do Covid-19, medida pelo acumulado de mortes por milhão de habitantes. Neste momento, toda a energia política dos brasileiros poderia estar sendo direcionada a controlar a epidemia e a combater a recessão, ao contrário de ser desperdiçada em discussões de reforma tributária, ainda mais quando alguns projetos só virão a vigorar em anos ou década.
Se sobram propostas e projetos, faltam dados e simulações. Esse é o único ponto comum entre a enorme quantidade de propostas na agenda, seja tramitando no Congresso Nacional, seja divulgada, muitas vezes só na mídia. Paralela a uma contaminação de ideias, morreram ou nem nasceram os estudos estatísticos que atualizem e aprofundem a cena atual, quanto mais que simulem os impactos nos cenários que decorreriam da aprovação das reformas.
Destaque-se que o Executivo Federal formalizou um projeto de lei (PL n. 3.887, de 2020) para substituir as duas contribuições sociais sobre receitas (mais conhecidas como COFINS e PIS) por uma nova, com incidência ampla e não cumulativa, sobre operações com bens e serviços (denominada por CBS). Consultada, com base na Lei de Acesso a Informação sobre as análises do CBS, a Receita Federal respondeu que “… não realizou estimativas de impactos que eventualmente poderão ser causadas pela criação do novo tributo”. [1]
Os parlamentares que apresentaram projetos de emendas constitucionais (PECs), inclusive os voltados a criar um ou mais de um imposto doméstico do tipo valor adicionado, também não se ocuparam de tal questão.
É forçoso reconhecer que apenas num único caso, o da PEC n. 45, de 2019, em tramitação na Câmara, baseado na criação do imposto sobre bens e serviços (IBS), uma entidade privada apoiadora de tal projeto – o Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) – publicou em seu portal da internet[2] uma nota técnica (mas não por ela assinada), sob título “Impactos macroeconômicos estimados da proposta de reforma tributária consubstanciada na PEC 45/2019”.
A referida nota conclui, em resumo, que a PEC 45/2019 teria um poder de impacto positivo sobre o PIB potencial brasileiro de 20,2% em 15 anos e de 24% no longo prazo. Impacto este decorrente, principalmente, do aumento da produtividade total dos fatores (14,4% em 15 anos e 16,4% no longo prazo) e do aumento dos investimentos em ativos fixos, que gerariam uma elevação do estoque de capital de 12,0% em 15 anos e de 15,6% no longo prazo.
Por ser uma raridade na atual cena nacional, embora não acompanhe nenhuma PEC e nem seja assinada pelo próprio CCiF, vale uma leitura atenta, à luz dos fundamentos da economia e da econometria, para não falar do bom senso.
Para uma réplica criteriosa à nota preparada para o CCiF, é possível nela identificar alguns pontos principais sobre as hipóteses do modelo, a metodologia utilizada e a forma como se mensura o impacto, problematizando a robustez dos seus resultados…”