Bretton Woods, Keynes e a utopia da cooperação entrevista de Fernando Cardim de Carvalho ao Valor Online (2013).
“Ideias de cooperação internacional não estão entre as mais bem-sucedidas que se conhecem, há décadas. Em assuntos financeiros, de comércio, de ambiente, áreas em que propostas de entendimento para fins coletivos são recorrentes, não faltam exemplos de iniciativas frustradas. Acordos podem até ganhar forma de certa consistência, e até perduram por razões de circunstância, mas acabam perdendo funcionalidade em meio aos fatos concretos de realidades mais intensas, domínios de interesses isolados, ou por que são apenas aparências construídas nas águas do oportunismo político. Bretton Woods faz parte dessa história de frustrações. A economia internacional tenderia a mover-se, então, indefinidamente, por interesses esparsos e desconexos, sem possibilidade de chegar-se a uma coordenação razoavelmente eficaz para a superação de crises como a atual, e outras que certamente virão?
O economista Fernando Cardim de Carvalho não tem nenhuma dúvida: “Uma coordenação de políticas macroeconômicas nacionais só é possível em duas circunstâncias: identidade de objetivos entre os líderes nacionais ou hegemonia de um país sobre o resto do grupo, que lhe permita impor suas próprias soluções sobre o coletivo. A primeira circunstância é, fundamentalmente, uma utopia. Mesmo quando enfrentam problemas comuns, como no caso de uma crise global como a que a economia mundial vive desde 2008, cada país tenta sair dela por si mesmo, inclusive ao preço de impor problemas adicionais aos vizinhos. Isso ocorreu, por exemplo, na década de 1930, quando a política cambial serviu de instrumento para exportação de desemprego, através da imposição de desvalorizações cambiais unilaterais que visavam aumentar exportações e cortar importações, no que ficou conhecido como a política de tornar seu vizinho um mendigo (“beggar thy neighbor”). Bretton Woods foi um exemplo da segunda circunstância. A hegemonia dos Estados Unidos, país vitorioso entre os vitoriosos da Segunda Guerra, era indisputada e permitiu à delegação americana ditar as regras do acordo que foi assinado em 1944.”..”