A Despesa Primária do Governo Central: estimativas e determinantes no período 1986-2016 por Manoel Pires e Bráulio Borges publicado por Estudos Econômicos (2019).
“O desafio fiscal brasileiro no momento atual é enorme. O aumento expressivo do déficit primário do governo federal nos últimos anos e a necessidade de se estabilizar a dívida pública (tanto a bruta como a líquida) intensificou o debate sobre a melhor forma de se obter o equilíbrio fiscal.1
Pelo lado da despesa, esse debate ganhou materialidade a partir do PLP 257/2016 que propôs a instituição de um limite de crescimento para a despesa primária. Posteriormente, o Governo Federal aprovou a Emenda Constitucional 95/2016, que indexou praticamente todo o gasto primário do governo central à taxa de inflação passada.2
A concentração do debate do ajuste fiscal em torno da despesa primária tem duas justificativas principais. A primeira é que a carga tributária brasileira já é bastante elevada, considerando o estágio de desenvolvimento econômico do Brasil e, portanto, o ajuste pela receita – solução colocada em prática no final dos anos 1990 e nos anos 1960 – é percebida, em geral, como uma solução com custo elevado.3 A segunda justificativa reside no fato de que a despesa primária federal, em percentual do PIB, vem em trajetória de contínua elevação a partir da nova institucionalidade estabelecida pela Constituição Federal de 1988.4
Esse movimento da despesa apresenta dois problemas. Em primeiro lugar, essa situação não representa um equilíbrio macroeconômico: nenhuma despesa deve crescer indefinidamente como proporção do PIB. Em segundo lugar, ela coloca uma pressão altista na carga tributária. Em uma versão extremada dessa lógica, não seria possível aumentar a carga tributária para financiar um gasto que cresce indefinidamente.
Este artigo irá contribuir com esse debate produzindo novas estimativas da despesa primária federal a partir de 1986. Vale lembrar que os dados oficiais produzidos pela Secretaria do Tesouro Nacional, da forma como são conhecidos hoje, têm início apenas em 1997. Desse modo, o presente trabalho ampliará o período de análise em 12 anos, incorporando informações sobre a política fiscal de três outros mandatos presidenciais: Sarney, Collor e Itamar, além dos anos iniciais do primeiro governo FHC.
A ampliação das séries temporais certamente ajudará a aperfeiçoar o entendimento a respeito do comportamento da política fiscal em vários aspectos, na medida em que elas cobrirão todo o período posterior à promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88) – um marco importante do debate fiscal, pois são muitos os autores que identificam uma relação clara de causalidade entre esse evento e o crescimento praticamente ininterrupto da despesa pública nas décadas seguintes. Adicionalmente, essa nova base de dados permite avaliar a execução da política fiscal em alguns períodos prévios ao ano de 1997, seu processo de formação e sua relação com os ciclos econômicos…”